TEMPO - Por Nelson Travnik.
T E M P O
Os Calendários e porque 2020 é um ano Bissexto?
Por Nelson Travnik*
Em meio as festas e aos abraços de fim de ano, em algum momento passam pela cabeça da maioria das pessoas que estamos adentrando em um ano bissexto e comemorando o ano errado ?
Em fevereiro portanto, em vez dos usuais 28 dias teremos 29 constituindo portanto uma ótima oportunidade para os nascidos no dia 29 comemorarem o aniversário na data certa. Ao contrário que possa parecer, a introdução do ano bissexto surgiu em 238 a.C. em Alexandria no Egito durante a monarquia de Ptolomeu III (246 – 221 a.C.) que decretou a adição de um dia a cada quatro anos para compensar o excesso de seis horas na duração do ano de 365 dias. A raiz portanto do ano bissexto está no Egito. Isso nos reporta ao estabelecimento dos calendários calcados nos ciclos do Sol , da Lua ou na união de ambos. Ninguém hesitaria em dizer que o dia não tem 24 horas e o ano em 365 ou 366 dias, valores que estão impregnados em nossas vidas. Para a astronomia contudo, a rotação da Terra se efetua em 23h 56m 04s e essa diferença de 3m 56s mais longo é que determina o acréscimo de seis horas anuais que, ao fim de quatro anos, resulta em mais um dia.
Quanto a duração do ano, observa-se que o ano solar ou ano trópico de 365d 05h 48m é definido como sendo o intervalo de tempo decorrido entre duas passagens consecutivas do Sol pelo chamado equinócio vernal, local em que o Sol cruza o equador celeste que é a projeção no espaço do equador terrestre. Para a astronomia, o que vale é o ano sideral com 365d 06h 09m que é definido como sendo o tempo gasto pelo Sol para retornar a mesma posição em relação as estrelas. No contexto pois desses valores, é evidente que a ausência de números inteiros, pares perfeitos, frações e números quebrados, constitui um problemão quando da elaboração de um calendário.
A história registra mais de 40 calendários no mundo. Atualmente temos os solares, cristãos ; os lunares, islâmicos e os luni-solares, hebreus. Para eles esse será o ano 5780-81 que começou no pôr do Sol do domingo 29 de setembro de 2019. No calendário chinês o ano será de 1717 , Ano do Rato, que irá começar no sábado 25 de janeiro. No calendário islâmico o ano é 1441-2 que começou no sábado 31 de agosto de 2019. Muitos povos iniciaram a contagem do calendário a partir de uma grande revolução, conquista ou evento marcante. Os judeu e muçulmano adotam fatos históricos.
Herdamos um calendário egípcio que com o passar dos anos acusava um erro acumulativo fazendo com que novo calendário fosse introduzido pelo imperador Julius Caesar no ano -46 a.C. apoiado nos cálculos do astrônomo grego Sosígenes. O Calendário Juliano mesmo produzindo um erro de aproximadamente 3 dias a cada 4 séculos, funcionou por mais de 16 séculos findo os quais constatou-se que as estações do ano não estavam acontecendo na época prevista. O equinócio da primavera no Hemisfério Norte caia por volta do dia 12 de março em vez do dia 21 ou 22 e isto estava causando enorme transtorno para a agricultura. Algo precisava ser feito e novo calendário foi instituído em 1582 através de uma bula do papa Gregorio XIII. Nele suprimiu-se 10 dias do Calendário Juliano passando o dia 5 de outubro proclamado para ser o dia 15. Outra mudança substancial foi feita : os anos bissextos que ocorriam rigorosamente a cada quatro anos, doravante só seriam bissextos os anos seculares divisíveis por 400. Estava assim corrigido o erro dos 3 dias a cada 4 séculos produzido no Calendário Juliano. Mesmo assim, com essas mudanças, o Calendário Gregoriano que utilizamos não é perfeito pois apresenta um erro de um dia a cada 3323 anos. As tentativas de mudança para um novo calendário resultaram infrutíferas pelas razões cima abordadas. Para a humanidade, essa diferença pouco significa mas para a datação de fatos históricos, em astronomia, ciência espacial e cálculos relativísticos, tal é inadmissível. E para isso entra em cena os relógios atômicos.
Um fato curioso é que apesar de separarmos o tempo histórico em duas fases, antes e depois de Cristo, não existe o ano zero ! A contagem dos anos a partir de um postulado sendo ano 1 do nascimento de Jesus não é correto pelas pesquisas arqueológicas e astronômicas recentes. Para o inicio da Era Cristã, Dionysius Exiguus, monge romeno que vivia em Roma no ano 525 d.C., cometeu um erro de computação em conseqüência da qual a nova era se iniciou com 5 anos de atraso em relação ao nascimento de Jesus Cristo que teria ocorrido no ano 7 a.C. Em seu livro “A Infância de Jesus’, o papa Bento XVI diz que Maria deu a luz entre os anos 7 e 6 a.C. o que concorda com os dados dos pesquisadores. Por fim, como tudo envolve o tempo, você já se perguntou o que é ele ? Nesse sentido, recordando o físico alemão Albert Einstein, “o tempo como é conhecido não passa de uma invenção”. Por conseguinte, pouco importa se estamos em 2020 , 2025 ou 2026.
*Nelson Travnik é astrônomo, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.