CIÊNCIA E FILOSOFIA - OS GRANDES DESAFIOS DO MUNDO E DA MENTE.
CIÊNCIA E FILOSOFIA
OS GRANDES DESAFIOS DO MUNDO E DA MENTE
por N E L S O N T R A V N I K *
Na história do planeta, bilhões de pessoas tem se quedado perplexas face aos mistérios da natureza, da mente e da vida, procurando respostas para essas questões que envolvem sua existência. Desde os albores da civilização há um anseio do homem para conhecer-se, saber de onde veio, onde está e o seu destino final.
Neste século em que tudo acontece e se transmite tão rapidamente, a ânsia das pessoas por verdades duradouras, vem se tornando cada vez maior. O intercâmbio de informações entre culturas diferentes é ao mesmo tempo estimulante, assustadora e pode ser entendido como um monstro de duas cabeças, capaz de propiciar conhecimentos, cultura, tecnologia bem como incitar todo tipo de ódio, violência e criminalidade.
Para isso contribui os filmes e jogos eletrônicos com cenas de indescritível violência. Com anuência dos pais, a “chupeta eletrônica” vai substituindo os brinquedos educativos e a boa leitura. Adolescentes armados intimidam colegas, afrontam os professores e promovem chacinas. O resultado é uma sensação de pânico e fragilidade que ameaça polarizar a sociedade a níveis insuportáveis. Consumismo virou sinônimo de felicidade. Drogas e suicídios crescem anualmente. E neste clima insustentável, surgem os oportunistas que se apresentam como única alternativa para nosso “mundo louco”.
Nada mais natural a proliferação de novas crenças, profetas e arautos da “nova era” que, graças aos menos esclarecidos, realizam “milagres”, prometem maravilhas e naturalmente acumulam imensas fortunas. Para eles, o inferno e o apocalipse são uma dádiva de Deus. Isso sempre existiu porém não aos níveis atuais. É parte da cultura humana. Conciliar nossa existência em direção a uma filosofia válida para um número infinito de mundos e seres pensantes, é uma tarefa quase inatingível. O único atalho para melhorar nossa compreensão, é estudar a ciência do céu, cientes que somos engrenagens microscópicas para entender o grande mecanismo.
Nosso planeta tem sido palco de inúmeras criações e destruições. Vestígios de colisões com asteróides e cometas estão por toda parte. Já experimentamos cinco extinções em massa. A última há 65 milhões de anos dizimou 80% da vida e nesse “pacote” lá se foram os dinossauros. Porém a maior há 250 milhões de anos extinguiu praticamente a vida no planeta e foi necessário novo recomeço. A colisão do cometa Shoemaker-Levy em Júpiter em 1994, fosse na Terra, você não estaria lendo esse artigo.
Ademais, violentas mudanças geológicas, geofísicas e climáticas já ocorreram e há fortes indícios que estamos indo novamente nessa direção. E quando isso acontecer, talvez o homem volte sobre si mesmo, seja humilde, observando que sua existência, seu planeta, sua história e suas conquistas, nada representa no universo. É como um grão de poeira ao sabor dos ventos do deserto.
A antiga concepção de um universo tranqüilo, de “paz celestial” , não existe mais. Os modernos meios de investigação astronômica tem mostrado um universo extremamente violento. Explosões de estrelas super e hipernovas aniquilando tudo com radiação X e gama em um raio de muitos milhares de anos-luz, outras transformando-se em gigantes vermelhas (como irá acontecer com o nosso Sol) “engolindo” tudo num raio de muitos milhões de quilômetros, buracos negros, os mais vorazes, capturando quem se atrever a aproximar-se dele e capaz de provocar a rotação de uma galáxia inteira enfim, este é o universo que a astronomia nos mostra atualmente.
A ciência nos aproxima da natureza, dos mistérios insondáveis do cosmo e nos transporta a uma percepção do mundo que pode ser também profundamente espiritual. Albert Einstein (1879-1955) justificava sua devoção à ciência como “sentimento religioso cósmico”. Nessa contemplação retrospectiva e raciocínio, poderíamos concluir que fé verdadeira, é aquela que justifica o comportamento humano com uso da razão frente a frente em todas as épocas da humanidade : das cavernas às conquistas espaciais.
Com este pensamento, com esta filosofia, estaremos incólumes quando as potentes antenas dos nossos radiotelescópios receberem aquela tão aguardada mensagem : também estamos aqui ! Os cientistas acreditam que pode haver civilizações lá fora que já chegaram a um estágio de desenvolvimento suficiente para emitir ondas de rádio. A partir desse momento, religiões e crenças terão que se adaptar a realidade da pluralidade dos mundos habitados. Isso não é novidade. Na antigüidade já havia alguns que apoiavam a idéia da existência de incontáveis mundos no universo. A escola de Epícuro (341 -271 a.C.) ensinava a pluralidade dos mundos e o poeta romano Titus C. Lucretius (97 -55 a. C.) a mencionava. Contudo os maiores defensores viriam com Giordano Bruno (1548-1600) em seu livro “De l’ Infinito, Universo e Mondi”, com Bernard Le Bovier de Fontenelle (1657-1757) em seu livro “Entretetiens sur la Pluralité des Mondes”, e com Camille Flammarion (1842-1925) em seu livro “La Pluralité des Mondes Habités”. Com a descoberta cada vez maior de exoplanetas, ninguém duvida mais disso.
Sabemos hoje : o universo é um celeiro de vida .
* Nelson Travnik é astrônomo, diretor do Observatório Astronômico de Piracicaba, SP e Membro Titular da Sociedade Astronômica da França.